sexta-feira, 20 de março de 2009

. nua e crua .

Quando pequena, sonhos para mim eram somente aquele amontoado de imagens que vinham em minha cabeça durante o sono. De modo natural, o real significado se apresentou a mim e assim compreendi a importância que possuíam. Seriam eles força motriz capaz de mover e mudar o mundo.

Sonhei ter a boneca mais bonita, casa com piscina e um cachorrinho. Sonhei ser paquita, guarda de trânsito e estilista. Sonhei ter bicicleta, virar adulta e conhecer a liberdade. Sonhei encontrar meu príncipe encantado e com ele ter pequeninas princesas ou mesmo principezinhos.

Tive tantas bonecas que ter a mais bela se tornou pouco importante. Da casa, queria o abrigo. Não conheci a Xuxa. Findei advogada, sem carros para coordenar ou modelos para rabiscar. Pedalei quilômetros para chegar onde cheguei e por nada trocaria as rodas e pedais por asas. O chão de minhas pegadas passou a ser extensão do corpo que empregou esta jornada. Sou livre e adulta, mas pago um alto preço por desejar permanecer criança. Trocaria meus 26 pela despreocupação e alegria peculiares dos que têm 12. O amor, não mais precisa ser de conto de fadas, aceito um reino real, de sentimentos reais, vindo de alguém igualmente real, ainda que imperfeito.

Aceitar a mudança de perspectivas e de projetos não é atestar o fracasso, mas reconhecer limitações e, inobstante o medo, seguir adiante.

Tantas vezes temi não suportar as tarefas impostas, quedar diante do que fugia do meu controle. Mas, resolvi ter uma atitude positiva diante da vida encarando-a de frente. Não seria ela maior ou mais forte que eu. Não seria ela altiva o bastante para me silenciar ou me roubar o grito. Seria ela, sim, feita e criada por mim. Fiz do meu ponto de vista, meu ponto de partida, decidindo que caminhos seguir e que sonhos carregar em minha bagagem.

Temi mudar, mas reconheci que a mudança não é uma opção. É imposição. Compreendi que o processo de modificação é natural, que foge das regras estabelecidas pela profissão que escolhi em que se exige “a iniciativa das partes somada ao impulso oficial”. Muda-se para permitir a total percepção da própria natureza, estabelecendo um compromisso sincero consigo mesmo, com o que se desejar ser. Aquele que se abstém de mudar, morre com a alma nua e com fome. Não é somente o ponteiro do relógio que se movimenta, não é somente o tempo que passa Nós também andamos, passamos, mudamos. E mais, necessitamos mudar, transpor, ultrapassar.

Sou daquelas que dá a cara a tapa, que não tolhe sentimentos, que não engole palavras. Sou feita de verdade nua e crua. Sou daquelas que aproxima ou que afasta. Sim ou não. Meio termo me incomoda. Sou daquelas que conhece a morte, mas prefere a vida. Que vive de saudade, mas se alimenta de lembranças. Sou daquelas que se reconhece finita, mas é adepta das reticências e não do ponto final. Sou daquelas que compreende que nem tudo pode ser real e que, ainda assim, preferiu trocar os sonhos, pelo eterno sonho de não perder a capacidade de sonhar.


(Regina Melo)

Um comentário:

Rafa Rocha disse...

Somente tu, Regina, conseguiria ser assim tão boa com as palavras, assim como és com os sentimentos. Te acompanho aqui também... Te amo, Amiga!